10.4.11

O espetáculo

A última semana foi, talvez, a mais soturna e sinistra dos últimos tempos, por conta do atirador do Realengo. Uma coisa horrível, que ninguém poderia imaginar acontecer numa escola, apesar dos inúmeros casos de crianças atingidas por disparos dados por colegas de classe, intencionalmente ou acidentalmente. Não, um franco atirador nunca tinha acontecido e é algo que ninguém entende, pois como comentou uma amiga minha uma pessoa normal não consegue entender o que motiva tal ato. A gente consegue entender um acidente, a gente consegue entender um disparo proposital por conta de uma briga ou algo do tipo, embora, estúpido, horrível, a gente entende. Mas uma pessoa entrar numa escola após ganhar a confiança de funcionários e uma professora por ser ex-aluno e reconhecido como tal, e se aproveitar disso para inexplicavelmente matar varias crianças? Não isso a gente não entende e não aceita. E é por isso que os últimos dias foram obscuros, estranhos, parece que a ficha vai caindo aos poucos, até bater no fundo do cofre e fazer um barulho e estremece a todos.

Mas algo que é tão hediondo, cortante e me enoja profundamente é o sensacionalismo com o qual, mais uma vez, a imprensa trata o caso. Há matéria para todos os gostos. Desde análises criminais, passando pelos habituais psicólogos e psiquiatras de porta de boteco, até chegar aos infográficos detalhadíssimos. Tudo isso mascarado com o verniz da tão batida "análise técnica" para melhor esclarecer o caso. Safadeza! Esse tipo de jornalismo é tão espetacularista, tão sensacionalista quanto o Cidade Alerta do Wagner Montes, como as fotos cruas que o jornal "O Povo" costumava publicar a tempos não tão remotos. A única diferença é que é mais "limpinho" para não se parecer com o outro grosseiro, pois o Globo e seus subprodutos são a cara da classe media. Então não pode ficar feio, não pode ser grosseiro. Mas continua tão sensacionalista quanto seus congêneres chulos.
Além do sensacionalismo travestido de bom senso e técnica, há os absurdos e grosserias dos jornais de cinquenta centavos como Extra, Meia Hora e Expresso. Esse último publicou uma matéria na sexta que eu fiquei com asco. O tal atirador era tratado pior que um animal. Gente, primeiro o cara era louco - alguém tem dúvidas de que ele era louco, depois do que ele fez? Pessoas normais saem por ai atirando a esmo? O problema não é a revolta da população, o que é perfeitamente normal, o problema é um veículo de comunicação ficar incitando a violência, o ódio, ao invés de informar e tentar fazer as pessoas refletirem sobre as possíveis causas da tragédia. Onde está o compromisso desses órgãos de imprensa com a sociedade e a cidadania? Cadê o compromisso com o bom jornalismo? Não há! O que existe sim são os interesses financeiros em ganhar cada vez mais dinheiro, através do ódio disfarçado de informação útil.
Jornais como os já citados seguem a velha formula do "torceu saiu sangue". Mas há limite! Frente a tanta tragédia, tanta dor, ninguém precisa de mais ódio, mais violência. Sinceramente, tenho nojo tanto de um Globo da vida e subprodutos televisivos, com seu ar asséptico, quando de um Expresso grosseiro e sujo. São todos farinhas do mesmo saco, bando de abutres se fartando com a tragédia alheia!

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