Há alguns meses atrás, numa conversa entre colegas de turma na faculdade uma das meninas disse que seria muito bom que o os brasileiros tivessem mais mitos, tivessem a mesma cultura norte-americana de cultivar alguns mitos da pátria. Isso me lembrou uma coleção de livrinhos muito popular nos anos setenta e oitenta chamada “Vultos da pátria”.
Cada livro contava a história de um brasileiro ilustre. Obviamente o enfoque do texto recaia sobre os grandes feitos do sujeito e suas qualidades patrióticas. Faziam parte da galeria de “vultos” personagens como marechais, coronéis, almirantes, políticos do final do século XIX e início do XX, bem como intelectuais da mesma época. Ah, como não poderia deixar de ser, também estava entre os grandes mitos Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, grande ícone da liberdade produzido durante os primeiros anos da República Brasileira.
Felizmente esses livros caíram no esquecimento e hoje são apenas encontrados em sebos. Mas o desejo pela existência de mitos ainda persiste no coração e na cabeça de muitos brasileiros, como se isso fosse um sinal de orgulho e valorisação da "pátria". A questão é por quê é tão importante existirem mitos, e que mitos eleger como representação de valores?
Segundo José Murilo de Carvalho, os mitos representam idéias e aspirações e são ponto de referência e identificação coletiva. Os “vultos da pátria” tinham a função de representar o civismo e o patriotismo, a construção de uma sociedade civilizada e moderna. Por isso temos, por exemplo, Tiradentes – luta pela liberdade e contra a monarquia; Rui Barboza – civilidade e modernidade; políticos da República Velha ou pós trinta, ou até mesmo do período colonial, todos comprometidos com a construção política do país; e os inúmeros militares representando a defesa da pátria contra os estrangeiros ou qualquer tipo de ameaça subversiva. Só não há personagem representando a democracia. Ou seja, os “vultos”, os grandes exemplos para o “povo brasileiro” são os representantes de uma sociedade conservadora e portadora dos valores do ideário liberal que exclui boa parte desse “povo”.
A construção do mito está intimamente ligada ao projeto político de nação que se quer implantar, remete a uma luta travada no campo ideológico pelo convencimento e a legitimação de uma ordem, identificada com um grupo ou grupos, através da personificação dos valores dessa ordem o a promessa de atendimento dos anseios da sociedade, num ícone, numa figura. Não estou querendo dizer que a sociedade é acéfala ou manipulada como um boneco, pelo contrário, penso que os grupos sociais tem suas demandas e a construção de mitos se baseia nessas demandas com o objetivo de cooptar o apoio político de cada grupo em favor do que (ou dos que) detém o controle das instituiçoes do Estado. Por isso é muito complicado falar em criar mitos, como se essa “criação” fosse algo natural e por isso descolado de todo um contexto político em que interesses e valores estão em jogo.
2 comentários:
Vulto, pra mim, significa fantasma.
Se vejo um, saio correndo!
Né não???
bj
Ahahaha... é inevitável fazer essa associação! rsrsrs... Enquanto escrevia também pensei nisso! KKKKK....
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