19.5.09

Algumas reflexões sobre ser mulher...


O que é ser mulher e mãe no mundo atual? Essa é uma pergunta para a qual não há resposta, há crenças pessoais, há escolhas, há a forma de viver mais conveniente para cada um, mas uma respostas fechada, absoluta, não há. Por isso eu fiquei profundamente indignada com a entrevista que Maria Mariana deu à revista Época do dia 11 de maio, dia das mães.
Para quem não lembra de Maria Mariana é atriz, roteirista, filha de Domingos de Oliveira, consagrado diretor de teatro, e ficou conhecida nos anos 90 porque publicou o livro Confissões de Adolescente, autobiográfico, narrando algumas de suas experiências adolescentes, o qual virou febre entre as meninas daquela geração (a minha geração). Na tal entrevista, a “escritora” (foi assim que a revista se referiu a ela, apesar de só ter escrito dois livros, o já citado, e o atual Confissões de mãe, lançado há pouco tempo) fala sobre ser mulher e mãe, proferindo verdadeiras pérolas, não somente do machismo, mas de extrema imbecilidade. Imbecilidade, não por ela optar por ser dona de casa e cuidar dos quatro filhos (o que acho algo de muito respeito, pois minha mãe e avó fizeram isso também) mas porque reafirmou uma série de generalizações e uma visão completamente antiquada e machista, sobre o casamento, sobre o lugar da mulher na sociedade e sobre a maternidade, algumas afirmações inclusive de extrema insensibilidade, como quando ela se refere por exemplo ao motivo de tantas mulheres terem depressão pós-parto.
Segundo MM, depressão pós-parto é coisa daquela mulher que não pariu com dor, parto normal, que não amamentou, mal sabe ela que muitas mulheres programam um parto normal durante toda a gravidez, mas por problemas de pressão alta, por não haver passagem para o bebe, na ultima hora precisam fazer uma cesariana. Muitas mulheres querem amamentar, mas o leite seca antes do tempo, e isso não tem nada a ver com querer ou não amamentar. Então essas nunca serão boas mães, porque não tiveram esse contato direto com seus rebentos? E as mães adotivas, elas são menos mães de seus filhos porque não pariram e não amamentaram? E o que dizer de mulheres que deram a luz de forma natural e mataram seus filhos por espancamento, ou por motivos frívolos? Ou aquelas que abandonam as filhas quando descobrem que o companheiro abusou delas e alucinadas pelo homem renegam a própria cria. Mãe é quem cria, que cuida, quem se preocupa; ser mãe é se comprometer, é ter espaço na sua vida para aos filhos, e não entregar sua vida aos filho, nem eles querem isso d’a gente! Só uma criatura muito burra e insensível para fazer tal afirmação tão leviana!
As mesmas bobagens se repetem, agora agora recheadas pelo machismo, sobre o casamento e o lugar da mulher na sociedade. Segundo MM o casamento é mais tolerância que amor. Ok, pode até ser, se bem que acho meio difícil ter tolerância se não houver amor entre duas pessoas, mas o problema de sua afirmação é que a moça confunde tolerância com subserviência. Para ela é coisa natural apanhar cuecas sujas do chão quando o moço não conseguiu acertar o alvo e deixou lá onde caiu mesmo? Não sou casada, nem sei se vou casar um dia, e acho sim que em qualquer relacionamento é fundamental a tolerância, agora, uma coisa intolerável é a mulher se comportar como uma empregada ou segunda mãe (tem de reeducar o marmanjo!)!
Agora, a pérola maior é quando ela diz que a mulher não foi feita para liderar, para estar no “leme”, isso é tarefa para os homens, a mulher tem o poder de influenciar, o homem tem raciocínio mais frio. Como é que é? Ou ela andou lendo o Corão, ou isso faz parte de uma estratégia para conseguir um papel no núcleo muçulmano, ou indiano, ou japonês, ou mórmon, ou ultra direita católica, ou protestante (ah, o discurso protestante também é machista pacas, falo porque convivo com isso diariamente!), na próxima novela da Glória Perez! Como assim a mulher não foi feita para liderar, para tomar decisões? Então, a decisão de se dedicar a família não foi de quem? Não foi dela? Foi o pai que decidiu? Ou o marido que impôs? Como é que ela pode trabalhar como diretora e roteirista de teatro se não tem capacidade de pensar, de tomar decisões?! Sim, pois foi isso que ela insinuou, que na sociedade o lugar da mulher é eternamente a sombra do homem. Essa história de que a mulher tem maior poder de observação e tal é um eufemismo para dizer que não temos capacidade.
Sabe o que me deixa abismada? Essa ameba só tem espaço para publicar seus livros meia boca e dizer essas besteiras na imprensa por causa de décadas de luta do movimento feminista, por muita porrada que as mulheres já levaram tanto fisicamente, quanto simbolicamente. Gente, ainda na década de 50 minha avó só pode assumir um emprego numa fábrica levando a autorização do pai (ela era divorciada e estava vivendo na casa dos pais, então o pai era o “responsável” por ela). Isso nem tem tanto tempo assim! Como é que essa imbecil em meia hora de entrevista consegue avacalhar com décadas de luta, luta que não se resume a liberdade sexual não, décadas de luta por direitos políticos, pelo direito de votar, pelo direito de estudar, pelo direito a liberdade de escolher seu próprio destino! É por causa da luta feminista que ela pôde publicar seu livro nos anos 90, contanto suas vivencias na adolescência, sem ser tirada como uma garota perdida, ou uma puta, pois há 50 anos atrás, ou até menos seu livro teria sido recusado, ou se fosse aceito ela seria vista pela sociedade dessa forma.
MM diz essas coisas, porque está na moda entre as atrizes pseudo-intelecutalizadas e vanguardistas. Provavelmente tem babá e empregada para “ajudá-la” nos afazeres domésticos. É típico de gente que não vive no mundo real, mas em seu mundinho perfeitinho e fechado e individualista, sem a menor percepção do que acontece para além de sua janela. Se realmente tivesse que lutar pela sobrevivência, se realmente pensasse minimamente sobre a vida, sobre o mundo que a cerca e não somente sobre seu próprio umbigo, sobre suas experiências tão profundas como um copo d’água, saberia um pouco mais da vida real, das lutas sociais e políticas que as mulheres têm travado diariamente há décadas e que a relativa liberdade da qual gozamos hoje é fruto dessa luta, e não abriria a boca para falar tanta besteira.

É isso!

1ª imagem: Mulher adormecida. Pablo Picasso
2ª imagem: http://ideias.blog.dada.net/tag/luta
Mais sobre esse assunto: Corra Lola, Corra

5 comentários:

Zerfas disse...

Cora Lola, corra!

É pseudo intelectual é algo que ta se tornando comum na sociedade efemera de hj...
Sou obrigada a dizer q li o primeiro livreto dela (maria Mariana) e na epoca a minha tia me criticou severamente por isso, pois achava o livro um escandalo. Na epoca fiquei impressionada com os relatos, mas nada daquilo tinha de haver com a minha realidade. Hj vejo a mesma com confissões "maternas" longe da realidade geral da população, que ainda enfrenta a gravidez na adolescência, não por falta de informação, mas por falta de dialago familiar, a falta de identidade com o novo nucleo familiar que se tem criado , onde a MULHER é na maioria das vezes a chefe da residencia e administradora do lar. A mulher tem como ser e é lider em muitos cargos, como também precisa de um espelho masculino, em muitos casos para acertar na mão admistrativa.
Sou machista, não nego, porém acredito que é da mulher a ultima palavra de decisão, mesmo quando ela não fala nada, e deles .. em muitos casos.. - Sim senhora!
Beijos Vivi e otima reflexão!

Carla S.M. disse...

Pois eu não sou nada machista e reclamo bastante (sou uma chata, mesmo), pois tolerância não significa tolerar tudo não, mas aceitar certas diferenças para conviver em clima de harmonia. DEtalhe: eu sou casada com um mulçumano que de machista não tem nada.
Fiquei muito desapontada, pois vi a peça "confissões" e na época gostei muito.
Inacreditável!!!
Viviane, acho que você deveria mandar este texto para a revistinha. :)

Romanzeira disse...

Oi Carla, eu acho difícil eles publicarem e se publicarem vão editar e porvavelmente cortar as melhores partes, mas vou mandar sim.

klenio disse...

É, Vivi, isso aí é pra gente ver que existe uma distância considerável entre a pessoa e o artista. E a palavra artista neste caso não entra como sinônimo de uma dita qualidade artística.

Romanzeira disse...

Klamber, sobre a qualidade artistica da MM eu nunca duvidei de que era pífia! rsrsr... "Confissões..." é um livreco meia boca. Mas, na boa, falar tanta besteira, chegar com um discurso que nem a minha avó de 75 anos usa mais, não é mole! Ai, cansa a minha beleza, cara! rsrs...Ou ela é burra mesmo, ou está dissimulando, ou é ultra-conservadora! rsrsrs



* * *

Ester, provavelmente eu tenho algum machismo dentro de mim, até porque somos crias do nosso tempo e o machismo assim como a misoginia (que são diferenes mas tendem a andar muito juntos, um do outro), ainda são fortes em nossa sociedade, ou seja, somos influenciados por eles, alguns e menor grau, outros em maior grau. É como o preconceito, todo mundo tem os seus. o importante é não deixar que eles nos ceguem, é estarmos abertos para perceber quando estamos sendo preconceituosos e lutarmos contra isso.

bj.