13.9.06

Sobre “Minha vida sem mim” (My life without me)

Eu não costumo escrever sobre mim, gosto mesmo de criar histórias para expressar o que penso, a forma como vejo o mundo. Mas hoje resolvi escrever diretamente, sem criar metáforas. Ontem assisti ao filme “Minha vida sem mim”, adaptação de um conto norte americana, dirigido e produzido por espanhóis, com atores americanos e ação se desenrolando nos EUA. Conta a historia de uma mulher de 23 anos, mãe de duas filhas, pobre, que vive num trailer no quintal da casa da mãe num subúrbio, e que descobre ter câncer e morrerá em três meses.

É um filme é bem diferente das centenas de filmes norte-americanos que abordam o mesmo tema e que geralmente são cheios de clichês ou exageros dramáticos, mostrando pessoas “bem sucedidas” - executivos, advogados e afins - morando em condomínios de luxo tipo esses que existem na Barra, mas com casas, que de repente “descobrem o valor da vida e das coisas simples”. Não, este filme mostra pessoas como eu, você, o padeiro da esquina, que trabalham, que lutam, que sonham, que tem pouco tempo pra pensar na vida. Isso me tocou.

O que se pensa quando já se sabe que vai morrer? Que você vai deixar esse mundo e que ele vai continuar existindo mesmo sem você? Você não vai mais sentir a chuva te molhando, um cheiro bom, uma brisa, o calor de 40 graus, ou vir conversas cotidianas. Seus parentes e amigos estarão, comemorando aniversários, e indo a shows, assistindo filmes que você adoraria curtir? Você não estará mais nesse mundo. Eu pensei sobre isso, quando um amigo meu morreu aos 29 anos, pouco mais velho que eu na época. Foi estranho porque estava acostumada a ver gente de mais idade morrer. Pessoas que já tinham vivido um certo tempo e deixavam essa vida na ordem normal, como deve ser, ou como a gente pensa que deve ser. Eu estava no ônibus uns dias depois da morte dele e comecei a pensar que ele não estava vendo aquela rua, aquele dia, o sol, ouvindo o barulho do trânsito. Desde então a morte surgiu na minha vida como algo real, concreto. Isso não me causa desespero, nem apreensão...Só que agora eu penso sobre algo que ignorava.

Da mesma forma que a morte surgiu como algo concreto, material, a vida surgiu pra mim quando meu sobrinho Francisco nasceu. Eu nunca tinha cuidado de uma criança, observado ela crescer, sua comunicação, sua forma de expressão. Isso era algo distante. Eu via as crianças como algo “bonitinho” e às vezes inconveniente...Nunca tinha visto uma criança como um ser humano que esta crescendo e aprendendo a viver. Agora, que percebo isso claramente, fico muito, muito emocionada mesmo. Amo muito esse garotinho, não só porque é meu sobrinho, mas pq me fez descobrir um monte de coisas a meu respeito, a respeito do mundo, a respeito da vida. Ele olha pra mim, confia em mim, dorme no meu colo, ri das minhas palhaçadas, me respeita quando brigo com ele (outras vezes, não muito). Eu o ensinei a gostar de música, hábito que o pai e a mãe continuam cultivando. E agora quando ele ouve qualquer melodia já balança a cabeça, já reconhece. E isso me enche de felicidade. Foi convivendo com dele, desde o seu nascimento, que tive noção concreta da existência e importância da vida.

Em fim, “Minha vida sem mim” não é um filme feito para fazer chorar, mas para fazer pensar e choramos porque acabamos pensando sobre as questões que ele coloca. Questões existencialistas que a gente nunca pensa, ou foge de pensar. Não é um filme sobre morte, mas sim sobre vida, sobre tempo. Talvez seja assim devido a direção que é européia. Não é uma superprodução com artistas famosos, diálogos longuíssimos, locações luxuosas. Não! Ao contrário, é um filme feito com olhares, gestos, poucas palavras, silêncio, com uma trilha sonora instrumental fantástica, introspectiva. Um filme, triste, sutilmente triste. Sem pieguices, sem exageros, humano, bonito...

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